O Castelo Rá-Tim-Bum faz 30 anos – e o que eu tenho a ver com isso?
Nossos comerciais, por favor: hoje é dia de celebrar um dos maiores programas da TV brasileira e também... explicar porque eu tenho uma Celeste na sala de casa
Nesta quinta-feira, 9 de maio, o Castelo Rá-Tim-Bum completa 30 anos de sua estreia. Hoje à noite, às 19h, faz exatos 30 anos que Nino enfeitiçou a bola do Zequinha e atraiu não só ele, mas também, Pedro, Biba e uma multidão de crianças para o Castelo da tia Morgana. Mais que simples magia, o Castelo mudou a história da televisão brasileira e encantou algumas gerações ao longo das últimas décadas. Tal como muita gente que nasceu nos anos 1990, eu também faço parte dessa legião de fãs.
Mas essa newsletter extraordinária não é exatamente só a celebração de uma efeméride, até porque eu não incomodaria vocês com isso se o assunto não fosse minimamente relevante. Estou aqui frequentando sua caixa de entrada por um motivo que talvez muita gente que tenha vindo parar aqui no balcão desconheça: eu escrevi um livro sobre o Castelo.
Raios e Trovões – A História do Fenômeno Castelo Rá-Tim-Bum, lançado pela editora Summus em 2019, é a minha tentativa de explicar como um dos programas mais incríveis já feito pela TV brasileira foi feito. Há várias formas de explicar porque eu fiz esse livro. A primeira – e mais honesta de todas – é a de que eu precisava me formar na faculdade. Sim, eu usei a desculpa “é pro meu TCC” para poder conversar com gente que fez parte da minha infância e me inspira até hoje.
Mas não foi só: perto de me formar, quando estava em busca de um tema, um dos motivos que me fez escolher o Castelo foi justamente o fato de que não havia nenhum livro que contasse bem a história de como o programa foi produzido. E aí decidi seguir intuitivamente o conselho de outra grande inspiração, o escritor americano Michael Azerrad (o cara por trás do incrível Our Band Could Be Your Life): “se ninguém escreveu o livro que você quer ler, vá lá e escreva”.
Parece fácil falar, mas foi um pouco mais difícil do que isso: entre a primeira entrevista e a versão final do livro que chegou às livrarias, foram mais de cinco anos de pesquisa, escrita, mais pesquisa e mais reescrita. (Antes que vocês perguntem, eu me formei com nota 10, graças a Deus, mas o trabalho naquela época era bem diferente do resultado final, cheio de vícios de linguagem de quem ainda começava a escrever profissionalmente). Ao todo, foram mais de 30 entrevistas e umas quatro versões diferentes do livro (que receberam nomes de trabalho malucos como A Vingança, A Missão e… Uma Nova Esperança). Mas isso tudo são detalhes chatos, eu sei, eu sei.
Mais legal é contar pra vocês que eu tenho uma Celeste na sala de casa, igualzinha à original e feita pelo Jésus Sêda, o criador da nossa querida cobra que só queria ter braços e pernas. Ou dizer que eu não só fui na exposição do MIS três vezes, mas pude ver todos os bastidores. Que além da Celeste, eu também conheci as versões originais do Relógio, do Gato Pintado, do Ratinho e daquela maquete maravilhosa que passava na abertura. Pra completar, ainda posso contar que pude estar na sala do Castelo (a da exposição do MIS) e ouvir ninguém menos que Sérgio Mamberti, o nosso querido Dr. Victor, me chamando: “Bruninho, vem cá”.
Eu também pude passar horas incríveis ao lado de gente que me inspira até hoje – a bem da verdade, a média de duração de quase todas as entrevistas beira os 90 minutos, com alguns papos chegando perto de três horas de duração. Na época não tinha robô de inteligência artificial pra transcrever entrevistas, mas sim um esforço de família: na fase final do TCC, meu pai e minha mãe se alistaram para ouvir pelo menos uma dezena desses áudios e me entregar as anotações, algo que eu agradeço até hoje. (Eu também preciso agradecer à paciência da minha mãe de colocar uma gota de ketchup em cada rodela de salsicha que ela me servia para matar minha fome enquanto eu via o Castelo e ela preparava o jantar quando eu era pequeno – o que é mais uma prova que Dona Silvina é uma rainha).
No meio desse processo, eu também visitei os acervos da TV Cultura, e um pouco a contragosto da equipe da emissora, pude ter acesso a algumas informações bacanas – como o fato de que o figurino da Morgana custou US$ 1549 (lembrando que em 1994 o câmbio era R$ 1 = US$ 1). Por falar em figurino, outra coisa incrível que caiu nas minhas mãos graças ao figurinista Carlos Alberto Gardin foram os testes de figurinos feitos pelos atores, em que dá pra ver como alguns personagens eram totalmente diferentes do planejado. E até alguns atores: sabia que a Penélope era para ter sido feita pela Denise Fraga, e não pela Ângela Dip?
Sabia também que o Fernando Meirelles (Cidade de Deus) era um dos diretores do Rá-Tim-Bum – e que o Castelo nem era para chamar Rá-Tim-Bum, mas sim Castelo Encantado? Pois é: o livro tá cheio de curiosidades, e houve até quem tentou me convencer que a melhor forma de publicá-lo era um almanaque. Não concordei, embora tenha feito, no meio da pandemia, uma thread com mais de 350 curiosidades que talvez seja minha maior contribuição ao Twitter. (Olha a gafe: tem um erro já no primeiro tweet, porque o Castelo estreou às 19h e não às 19h30. Mas pelo menos eu espero ter acabado de vez com a lenda urbana que a Sandra Annenberg era uma das passarinhas).
Mas tem um bom motivo pra isso: mais do que a saga de um ou dois criadores, eu acho que o Castelo é uma história muito bonita de criação coletiva da TV brasileira, do trabalho de toda uma emissora – do presidente aos artistas de efeitos especiais, passando por atores, músicos e roteiristas. E o único jeito de contar essa história direito era mesmo em texto corrido, não-ficção, no formato jornalístico que eu aprendi a escrever.
Pra mim, o Castelo é um baita exemplo não só da força do improviso e da criatividade mesmo em meio ao caos, mas também da combinação de juventude e experiência, da academia e da experimentação artística, e sobretudo de uma vontade de fazer bem feito. “Fazendo tudo com carinho vai acontecer” não é só o verso daquela música que explicava como as coisas eram feitas; é também um lema desse programa que me deixa emocionado toda vez que olho aqui em casa e vejo a Celeste.
Passei muito tempo pensando no que eu deveria fazer nessa data tão especial de 30 anos do programa. Pensei em fazer uma série de novas entrevistas, houve até quem me falou pra eu publicar uma sequência de posts no Instagram ou algo assim. A
até sugeriu fazer uma newsletter especial criando um drink para o Castelo, mas a não ser uma versão alcóolica do glorioso surrebrifru (o super remelexo brilhante de frutas), não achei nada que pudesse valer a pena.Até porque acredito que a magia do Castelo não pode ser alcançada por qualquer spirit, muito menos por feitiçaria barata. E confesso que acredito que meu melhor trabalho está ali no livro, nas quase 250 páginas (infelizmente, sem ilustrações!) que contam não só a história do Castelo, mas também de programas como Mundo da Lua, Rá-Tim-Bum, Vila Sésamo, X-Tudo, Cocoricó e muitos outros.
Por isso, encerro essa newsletter com um convite singelo para que você leia Raios e Trovões – A História do Fenômeno Castelo Rá-Tim-Bum. Minha melhor peça de divulgação não é qualquer crítica ou resenha profissional que saiu na época de lançamento do livro (e olha que eu dei entrevistas para CBN, Estadão, Quem Acontece, Rádio Bandeirantes, o meu querido Scream & Yell e até para a Capricho), mas sim a leitura atenta da
quando a gente ainda estava longe de se beijar, quem diria de namorar: “Recomendo para todo mundo que precisa acreditar de novo”.Acho que é uma frase que eu mesmo ando precisando ouvir, enquanto tento aqui começar algum projeto de livro cinco anos depois de publicar o primeiro. Enquanto eu não ganho forças para avançar, vou adorar saber o que você achou do Raios e Trovões – e prometo solenemente autografá-lo caso a gente se encontre em algum balcão por aí com uma dedicatória fofa. Também prometo voltar aqui semana que vem com um drink e um disco novo em folha – é essa promessa, aliás, que faz essa newsletter valer a pena a cada semana ou quinzena. Mas, antes de ir embora, deixo vocês com mais uma curiosidade: “Hora de Dormir”, o famoso episódio perdido do Castelo, feito pela Cultura para o Natal de 1994. Acho que vocês vão gostar.
Em vez de um abraço, acho que hoje é dia de cantar parabéns. E não esquecer de gritar bem alto no Rá, no Tim e no Bum. Além disso, peço pra você compartilhar esse post com aquele amigo ou amiga que é fã do Castelo. Fechou?
Nos vemos na semana que vem?
Bruno Capelas
PS: Antes da gente ir embora, deixo aqui ainda três links rápidos. Ao longo desses 10 anos de Castelo, eu publiquei três das entrevistas do livro na íntegra no Scream & Yell, e acho que muita gente que já leu o livro ou a thread pode se interessar por elas. Tem um papo com o Luciano Amaral, outro com o Hélio Ziskind e, por fim, um com o Sérgio Mamberti. Ou também só porque eu senti falta de um PS nessa edição, hehe.
Enrolei muito pra comprar esse livro, até que o trombei na Feira do Livro da USP do ano passado e aí não tive mais desculpas. Comecei e não queria mais parar, trabalho de pesquisa e de escrita muito bem feito. Já indiquei pra várias pessoas e sei que pelo menos uma também adorou a leitura, aos poucos a gente espalha a palavra haha. Parabéns pelo livro, Bruno! E torço para que você encontre força para escrever esse novo livro aí!