Pergunte ao Bartender: Como pedir um drink num bar novo?
É a estreia de uma nova seção nesta newsletter: tudo que você queria saber mas não tinha ninguém com paciência pra responder
Há algum tempo eu cultivo com carinho uma ideia divertida para esta Meus Discos, Meus Drinks e Nada Mais: uma seção de dúvidas, perguntas e cartinhas dos convivas. Não que eu tenha todas as respostas para as mais variadas questões, mas um antigo chefe meu me ensinou que um bom jornalista é pago para aprender e explicar as coisas para os outros. Acho que na verdade esse foi um dos propósitos iniciais dessa newsletter: me inspirar a escrever sobre coquetéis me faria expandir meus horizontes bebendo. Por outro lado, sempre gostei muito de ler seções de dúvidas e cartas, especialmente pelo climinha de piada interna que rola em algumas ocasiões.
Seja como for, demorei um bocado para avançar nessa iniciativa. Primeiro, porque poderia soar presunçoso. Segundo, porque talvez as respostas pudessem demorar demais – ainda mais quando se tem o Google e robôs de inteligência artificial à mão (bip bip!). E terceiro porque não sentia que tinha espaço para abrir uma caixinha de questões do nada aqui no meio de um texto sobre um ou outro disco. Mas há uns dois meses, a Lorena F respondeu a um email atiçando minha vontade de escrever algo do tipo. Ela disse o seguinte:
“Compactuo com a ideia de fazer drinks em casa (ainda que por ora na teoria), mas fiquei pensando que seria legal tbm você falando de como pedir drinks. Tipo, se vc for num bar ruim / que não é conhecido pelos drinks, existe um drink à prova de erros, infalível? Agora, se vc tá num bar supostamente mais chic, quais drinks são cilada, e por que a caipiroska de lichia está entre eles? É ok pedir drinks fora do cardápio? Etc.”
Como diria Jack, o Estripador, “vamos por partes”.
Existe um drink à prova de erros?
Infelizmente, acho que a única resposta honesta para essa pergunta é não. Vou recorrer à etimologia: a “ciência” de se fazer um bom drink é a mixologia, o conhecimento das misturas. Para se fazer uma boa mistura, é preciso conhecer um bocado de proporções – e isso não diz respeito apenas aos líquidos ou substâncias que são incluídos num coquetel, mas até mesmo a quantidade de gelo e o tipo de copo em que a bebida é servida. É muito fácil pensar num coquetel e imaginar um erro que pode acontecer com ele, qualquer um.
🥸Olá, olá, olá! A Meus Discos, Meus Drinks e Nada Mais é uma tabelinha entre grandes álbuns e bons goles.
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Uma dica que dei para a Lorena quando respondi o email dela é que, em bares novos, desconhecidos ou com pouca fama de servirem bons coquetéis, uma dica é pedir coquetéis mais baseados em produtos “industrializados”, padronizados – isto é, álcool, refrigerante e água com gás, sem grandes invenções. A padronização costuma jogar contra bartenders de excelência, mas na mediana, é uma boa ideia: ela dá a quem faz o drink a responsabilidade apenas de acertar a proporção. No entanto, usar as medidas corretas pode ser uma questão complicada, especialmente em bares muito movimentados. Além disso, nem mesmo a padronização deixa coquetéis à prova de erros: já perdi a conta de quantos Negronis tomei que deram errado porque o gelo derreteu rápido demais e deixou a bebida aguada.
Historicamente, minha experiência demonstra que alguns coquetéis costumam dar mais errado que outros. Entre eles, estão dois favoritos da casa: Cosmopolitans e Mojitos. Conhecidíssimo graças à série Sex and the City, o Cosmo costuma dar errado por vários motivos: já vi bar trocando licor de laranja e limão por limoncello e suco de laranja, já vi bar apostando em suco de morango no lugar do cranberry, além de muito gelo e proporções todas erradas. Com o Mojito, que é aparentemente simples, o principal erro costuma ser uma economia burra: em vez de açúcar, água com gás e limão, muito bar por aí resume esses três elementos usando Soda Limonada, deixando o coquetel muito doce e pouco ácido… para um Mojito. Pode até ser gostoso? Pode, mas Fidel Castro vai vir puxar seu pé de noite se você chamar isso de Mojito.
Entre os dois meses em que a Lorena mandou o email e eu parar para escrever esse texto, confesso que tentei por à prova algumas outras ideias para ajudar. Pelo bem da ciência, gastei algumas centenas de reais entre bares de cruzeiro, praias e botecos por aí e aprendi algumas coisas. A primeira é que lugares meio fuleiros costumam saber entregar ao menos um bom drink: uma caipirinha. Acho que é uma questão de tentativa e erro, ou adequação ao meio: um bar não-chique no Brasil que não sirva uma caipirinha no mínimo decente está fadado ao fracasso. Comprovei isso na praia em Maceió e em Búzios, bem como no deck do MSC Seashore em viagem no último mês de dezembro.
A outra teoria é que quanto mais colorido for o seu drink (normalmente a partir de algum licor com corante), maior é a chance dele dar errado – especialmente se contiver Curaçau Blue. É uma pena, porque eu realmente gosto muito desse licor de laranja meio amalucado, que dá um colorido todo especial pras bebidas, mas ele é muito usado por quem tem a mão errada. Meu melhor exemplo foi o Lagoa Azul, um drink que eu bebi com ele no navio que era pura água, até chegar no fundo e ter basicamente o Curaçau concentrado. Fuja desse tipo de coquetel – o mesmo vale para aqueles muito frutados ou com muito suco.
Dito tudo isso, acho que valem aqui três dicas para resumir a parada. A primeira é que Caipirinha de Cachaça com Limão quase sempre costuma dar certo, mas nunca diga sempre. A segunda é que apostar em combinações simples, às vezes até com coisas que você pode misturar no copo pedindo os itens em separado, não é uma má ideia – e aqui estou falando de Gim e Tônica com aquela rodelinha de limão, ou Rum e Coca, para ficar em dois exemplos. Agora, se isso não te anima, vale o conselho maior: na pior das hipóteses, abandone o barco. Afinal de contas, é melhor ser feliz bebendo cerveja ou vinho do que forçar a barra em algo que não vai dar certo.
O que é cilada num bar mais chique?
Minha experiência com bares chiques – ou, pelo menos, bares um pouco mais arrumadinhos ou especializados em coquetéis – é menos extensa do que se pode imaginar, mas acho que tenho algumas dicas. Se o bar é só meio chique, mas não é especializado em coquetéis, fuja da caipirinha. Sério. As chances de alguém te entregar um Tom Collins excelente são maiores do que de uma caipirinha boa – que dirá uma caipirosca de lichia. Isso para não falar na sakerinha de morango, a bebida favorita do atacante Fred.
Agora, se o bar é especializado em coquetéis, é pressuposto que o bartender ou, se este não estiver acessível, o garçom, seja capaz de te dar uma boa dica sobre o que você está pedindo. Ainda assim, a menos que você tenha muita confiança (ou ousadura), eu diria que vale a pena fugir de drinks muito coloridos. Mas pra toda exceção tem uma regra – e uma das minhas é o Porn Star Martini, então…
É ok pedir drinks fora do cardápio?
Depende do bar. Se for um bar convencional, um bar e lanches ou um lugar que serve de tudo um pouco, é mais difícil pedir drinks fora do cardápio – a casa pode simplesmente não aceitar ou nem saber bem como te cobrar. Além disso, há sempre o risco de você pedir algo e o coquetel vir malfeito para sua mesa. Assim, eu prefiro não arriscar. Agora, se o bar já tem uma carta de coquetéis, é bastante comum pedir drinks fora do cardápio – há até aqueles estabelecimentos que têm apenas misturas autorais em sua carta e deixam o conviva livre para pedir os clássicos. Por outro lado, há certos lugares que ODEIAM pedidos de drinks “clássicos”, porém meio… orkutizados? Talvez seja essa a expressão correta. Por exemplo, nesse cardápio que vi outro dia…
Particularmente, acho que quem se nega a fazer um Mojito deve ser assombrado pelo fantasma de Ernest Hemingway. Mas, humores à parte, fica uma questão: o que é um clássico? Confesso que a cada dia, navegando pelo Instagram ou lendo sobre drinks, descubro um novo drink clássico do qual eu nunca ouvi falar. Durante algum tempo, me baseei na lista da International Bartenders Association, que é um bom parâmetro – mas mesmo ela inclui inúmeras bebidas que eu nunca vi em menus aqui no Brasil.
Meu melhor critério de decisão, porém, é observar o cardápio e ver se o drink que eu quero beber é possível de ser montado com as bebidas que a casa utiliza na sua carta. (Um exemplo simples: recentemente fui ao Pina e queria beber um Sidecar para fechar a noite, mas eles não tinham conhaque na carta, então não funcionou). Normalmente, porém, essa ideia costuma funcionar: se um bar tem drinks com gim, vermute e Campari, é super factível pedir que eles te façam um Negroni. No entanto, devo dizer que é algo que eu faço pouco: trabalhando com a substituição de importações, eu costumo deixar para beber na rua algo que eu não sei fazer, o que invariavelmente acaba me fazendo ficar na carta do lugar em vez de inventar moda.
Por fim, e a fim de ajudar o leitor ou leitora a perder sua inibição, deixo um conselho: muitas receitas clássicas de coquetéis nasceram justamente da sugestão de um bebedor ousado à beira de um balcão. O Negroni nasceu quando um conde pediu para o bartender trocar a água com gás do Americano por gim. Já o Gold Rush surgiu de uma substituição do xarope de açúcar do Whiskey Sour por xarope de mel, só para ficar em dois exemplos. Assim, não tenha medo de pedir. Vai que você acaba cometendo uma combinação clássica?
Espero que eu tenha respondido bem às perguntas da Lorena. Como eu disse, eu não tenho certeza de nada (ainda mais depois de um ou dois copos). No entanto, quero saber: que pergunta você tem para este bartender e sound colocator? Vale inclusive perguntar coisas que não tem a ver com música ou com bebida, afinal, este também pode ser o seu consultório sentimental. A gerência afirma, porém, que se reserva o direito de não atender a todas as solicitações. Deixe sua pergunta nos comentários (tem até um botão pra te levar pra lá) – mas se você tiver vergonha e quiser fazer uma pergunta anônima, só responder essa newsletter com um e-mail. Nós preservamos o sigilo da fonte!
Além disso, queria aproveitar a deixa para fazer algumas perguntas para quem lê esta newsletter. Para não deixar a coisa extremamente cansativa no meio deste email, decidi abrir um Google Forms com algumas perguntinhas. Prometo que vai ser rápido (e ajudará muito no futuro desta newsletter, sério mesmo <3).
E além disso, temos os reclames da semana:
No Programa de Indie, muito orgulho tenho de dizer que fizemos um especial de duas horas (!) sobre o saudoso Tom Verlaine, guitarrista do Television, que nos deixou no finalzinho de janeiro. Eu e Igor mapeamos a trajetória de Verlaine e seu legado para a música, além de um sem-número de bandas influenciadas por ele e suas guitarras mágicas.
E na indicação de newsletter da semana, o melhor resumo semanal de tudo que acontece no mundo pop pra você que se perde num emaranhado de links: a
, do queridíssimo – grande companheiro de shows, festivais e botecagens discutindo Wilco.
Por hoje é só, pessoal! Semana que vem tem mais disco e drink pra gente. E olha só, sem PS dessa vez.
Um abraço,
Bruno Capelas