Círculo do Disco: um tira-teima de clubes de assinatura de vinil
Um guia de compras para quem quer receber um disco novo em casa todo mês – ou evitar o FOMO de perder uma edição do seu artista favorito
Dia desses, uma amiga me chamou no WhatsApp pedindo dicas sobre clubes de assinatura de vinil. Juro que não é uma amiga hipotética (como as influencers gostam de dizer), mas não revelarei o nome para não estragar a surpresa de um presente que vem aí. Fato é que me dei conta de que apesar de ser uma ideia simples de negócio – você paga uma assinatura mensal e recebe todo mês um disco em casa –, tem muitas questões para se explorar nos clubes existentes no Brasil.
São três os principais: o popular Noize Record Club, o “para iniciados” da Três Selos e o industrial Clube do Vinil Universal. Assim, nasceu a ideia deste tira-teima, buscando ajudar quem por ventura está com dinheiro sobrando e quer receber um bolachão regularmente pelo correio.
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Entre os três clubes, há várias diferenças não só no preço ou na curadoria, mas na logística e na qualidade dos discos. Esses aspectos – bem como benefícios adicionais que cada um pode ter – são os quesitos que vou levar em consideração aqui. Para fazer as comparações, vou me basear nos discos que tenho na coleção de cada um dos programas, bem como na opinião de amigos próximos que também adoram ver a agulha passeando pelos sulcos vinílicos.
Noize Record Club

Preço: R$ 95 + frete (assinatura mensal); R$ 200 + frete (compra avulsa)
Logística: Todo dia 10, a Noize revela a edição de cada mês. A compra avulsa normalmente se esgota no mesmo dia; já a assinatura mensal pode ser feita até o dia 9 do mês seguinte. A partir daí, a empresa faz os pedidos e a entrega do disco em questão acontece de três a cinco meses depois. A assinatura mensal tem uma adesão mínima de três edições.
Curadoria: com cerca de 10 mil assinantes, a Noize tem a curadoria mais “pop” dos três clubes. Ela alterna clássicos da MPB (Gilberto Gil e Elza Soares são aparições frequentes) com nomes recentes (Marina Sena, por exemplo, tem a discografia completa editada pela Noize), passeando bastante pelo rap (Rashid, Yago Oproprio e Marcelo D2 estão nos últimos 12 meses) e pela nova MPB. Ah: não se espante se a lista de discos da Noize tiver uma proximidade grande com os escalados pelo Coala Festival – Marcus Preto, um dos curadores do evento, também faz parte do comitê que decide os discos da NRC.

Qualidade dos discos/material gráfico: Aqui é um dos pontos fracos da Noize. As prensagens, em sua maioria feitas pela fábrica nacional Polysom, são boas, mas não incríveis – especialmente em comparação com o que é feito pela Três Selos. Já o material gráfico por vezes deixa a desejar: às vezes, é perceptível que as capas e encartes não foram devidamente “remasterizados”, sofrendo com baixa definição e/ou pixelização. Em compensação, é preciso elogiar a revista que acompanha todas as edições com reportagens temáticas e entrevistas bacanas – bonitas na forma e no conteúdo.
Benefícios adicionais: Além das edições mensais, a Noize é a que tem mais cara de “clube”: vira e mexe, os assinantes recebem descontos ou sorteios para shows e festivais. A empresa também lançou seus primeiros eventos próprios no ano passado – como o caso do show acústico de Otto na Casa de Francisca tocando o clássico Certa Manhã…. Outro destaque são as reprensagens da coleção e o NRC+, com lançamentos paralelos e descontos para assinantes. (Dos oito discos lançados até agora, só peguei um: o Acústico de Marcelo D2). Outro benefício é o Pontos NRC, um programa de fidelidade que dá R$ 10 para gastar na loja da empresa para cada novo membro indicado. Se você for assinar, usa o meu link, vai?
Opinião pessoal: Com cerca de 10 mil assinantes, a Noize tem como principal questão a curadoria: se nem Jesus agradou a todos, é difícil que a curadoria agrade a um público tão diverso. Um amigo meu diz que a proporção da empresa é dar uma alegria a cada três tristezas – ou seja, um disco realmente bacana para cada quatro lançamentos. Do último ano, gostei verdadeiramente de cinco dos 12 lançamentos. (A saber: Cansei de Ser Sexy, Marcelo D2, Mundo Livre S/A, O Terno e Vitor Ramil).
Então, como é que a conta fecha? Um primeiro ponto é que, com o tempo, os discos acabam se valorizando. Outro é que a Noize costuma ter revenda fácil – até porque tem muita gente que não assina mas vira-e-mexe quer um disco ou outro. (O problema é quando a curadoria acerta em cheio e um disco acaba sumindo do mercado secundário, como é o caso do Verde Anil Cor de Rosa e Carvão, da Marisa Monte, ou Abaixo de Zero, do Black Alien). Além disso, como é o mais barato dos três clubes, é também a moeda de troca mais barata disponível por aí. Disclaimer: É o único que eu assino hoje, mas… se alguém tiver interesse no meu Rashid eu faço um valor módico, viu?
Três Selos

Preço: R$ 130 + frete (assinatura mensal); R$ 190 + frete (compra avulsa)
Logística: Assim como a Noize, a Três Selos trabalha com um sistema de demanda-fabricação-envio. Ou seja: as edições são anunciadas no início de cada mês, podendo ser adquiridas ao longo do período. Depois a empresa reúne os pedidos, fabrica e envia… mas são frequentes as reclamações por atrasos ou ritmo abrupto – às vezes fica três meses sem enviar, às vezes chegam três discos num mês. (Não é um enorme problema para mim, mas há quem seja ansioso ou goste do ritual mensal). Assim como na Noize, o prazo mínimo para cancelar a assinatura é de três meses.
Qualidade dos discos/material gráfico: Nesse aspecto, não tem nem disputa. Além dos discos serem todos 180g, com prensagem pela Rocinante e masterização do Arthur Joly, o material gráfico da Três Selos é de babar. Todos os discos são em capa dura, tem encartes com pesquisa assinada por gente como Bento Araújo (do Poeira Zine) e Lorena Calabria e, vira-mexe, mumunhas como pôsteres ou encartes extra. Já postei aqui sobre o do Nando Reis, que é um desbunde: tem pôster e dois encartes, um com fac-símiles das letras. É difícil competir.
Curadoria: Um jeito fácil de descrever a curadoria da Três Selos é que ela é um lado B da Noize. De maneira geral, também há um passeio por clássicos da MPB e nomes recentes, mas nos dois aspectos a seleção é mais alternativa: em vez de Gil, tem João Donato ou Guilherme Arantes; em vez de Marina Sena e Rashid, Djonga e Tássia Reis. Como pesquisador de música, acho a seleção mais instigante, mais profunda e mais divertida, embora isso não se reverta na prática em uma coleção volumosa: dos últimos doze lançamentos, só tenho um (o Moto Perpétuo, banda de Guilherme Arantes nos anos 1970). Para quem pensa em valorização e revenda, vale o aviso: seja pelo número de assinantes ou pela especificidade das edições, a Três Selos tem chance de se tornar mais rara no futuro.
Benefícios adicionais: Além dos discos, o grande benefício da Três Selos são descontos adicionais – seja nos lançamentos da Rocinante Três Selos (que tem feito um ótimo trabalho de reprensagens) ou no catálogo dos três selos que dão nome ao clube, o Nada Nada Discos, o Assustado Discos e a EAEO Records. Juntos e separados, os três já lançaram muita coisa bacana.
Opinião pessoal: Na teoria, o clube da Três Selos seria minha indicação de olhos fechados para quem gosta mesmo de música brasileira. É uma curadoria com diversidade, com resgate de discos e que instiga o assinante – além de oferecer edições realmente especiais a um preço ligeiramente maior que a dos concorrentes. No entanto, a prática é diferente: nem sempre o que se busca como colecionador de vinil se reflete numa proposta de curadoria. Além disso, o fato de raramente sofrer com preços altíssimos em reedições da Três Selos tiram o meu gatilho emocional de assinar – é preciso procurar, mas não é difícil encontrar os discos por aí, seja em lojas ou em grupos de revenda do Facebook. Mas, repito: se você assinar, vai ter discos de qualidade incrível na mão.
Clube do Vinil Universal

Preço: R$ 140 (assinatura mensal); R$ 230 + frete (compra avulsa)
Logística: Diferentemente da Noize e da Três Selos, o Clube do Vinil Universal trabalha com pronta entrega: você assina o clube num mês e no final do período ele já chega na sua casa. É uma das principais vantagens do clube contra os concorrentes – e o tipo de coisa que uma grande gravadora pode fazer: fabricar os discos prevendo a demanda lá na frente. Outra vantagem é que a Universal é a única que divulga antecipadamente quais discos serão lançados no futuro – o que ajuda a prever melhor quando vale a pena assinar, considerando também o período mínimo de três meses para a adesão.
Qualidade dos discos/material gráfico: Nem tanto ao mar, nem tanto à Terra: a qualidade gráfica dos discos da Universal é bacana, traz encartes originais, mas não surpreende pelo luxo – como acontece com a Três Selos. A prensagem dos discos, porém, costuma ser superior à da Noize: em vez da Polysom, os vinis costumam ser prensados na Rocinante ou até mesmo na Argentina, embora não exista uma casa fixa para a associação da Universal. A gravadora gosta de dizer ainda que os discos tem OBI – aquele papel que envolve o disco, muito comum nas edições japonesas –, mas confesso que acho meio feia a forma como é feita, como dá pra ver na foto acima.

Curadoria: assinada por Charles Gavin, a curadoria do Clube do Vinil traz à tona o enoooorme catálogo de música brasileira da Universal – que controla o catálogo de Philips, Polydor, Odeon, Ariola e mais uma porrada de selos históricos. De maneira geral, a curadoria é bem interessante e passeia entre clássicos absolutos e obscuros da MPB – embora de vez em nunca tenha um lançamento gringo como Sheer Heart Attack, do Queen, que eu suspeito que seja desova de estoque do exterior. Na maior parte do tempo, a curadoria traz discos que são raros ou bem caros de achar nas prensagens originais (a exemplo do Feminina, da Joyce, que saiu em abril). O ponto fraco é quando isso não acontece: lançamentos recentes, como Vida, de Chico Buarque, ou Álibi, de Maria Bethânia, são fáceis de achar pelo valor de uma onça-pintada em sebos por aí.
Benefícios adicionais: Além de ter frete grátis (único dos três clubes que oferece tal benefício), o Clube do Vinil Universal também dá frete grátis na loja da UMusic e cashback de 15%. Como o catálogo é feito antes dos pedidos, também é possível comprar edições anteriores. Mas vale o aviso: o atendimento da UMusic é simplesmente um dos piores que eu já vi em 20 anos de usuário de e-commerce – e não duvido que tal característica se estenda ao clube.
Opinião pessoal: Confesso que nos últimos meses, cogitei trocar a assinatura da Noize pela da Universal – os acertos andam em frequência parecida, enquanto os discos que não me agradam tanto da Universal me parecem mais razoáveis de permanecer na minha coleção. Por inércia, acabei não fazendo, mas talvez essa ideia volte à tona em breve. Um dos argumentos a favor do Clube é que ele tem menos assinantes que os outros dois – e por isso, algumas de suas edições tem boas chances de ficarem raras. (A do Com Você Meu Mundo Ficaria Completo, da Cássia Eller, está girando em torno de R$ 1000 por aí). É uma boa tanto para quem quer evitar ficar sem um disco favorito ou para quem tá em dúvida se vai conseguir passar adiante o que não gosta.
Na ponta do lápis… ou da agulha
Eu adoraria que essa newsletter fosse a revista Capricho para oferecer um quiz pra você aqui no final dizendo qual clube você deveria assinar. Mas gosto mais de deixar o leitor tomar suas conclusões por conta própria. Chuto eu que quem gosta muito de MPB vai ser mais feliz com o Clube da Universal, quem é mais ligado em lançamentos vai gostar da Noize e quem é bem alternativo vai preferir a Três Selos – mas isso não vale pra todo mundo, porque eu mesmo sou a contraprova do que acabo de tentar postular.
O que eu espero de coração, caro leitor, é que esse texto tenha ajudado você a pensar que os clubes podem ser uma maneira bacana de aumentar sua coleção de discos. Mas não são a única: meu lado saudosista ainda acha mais interessante vasculhar sebos e feiras de vinil do que receber um disco em casa no meio de uma tarde qualquer. Além disso, é importante por na conta que assinar um clube é mais uma despesa fixa em meio a muitas despesas fixas que todo mundo tem hoje em dia.
Por outro lado, vale o aviso: com grupos no WhatsApp, no Facebook ou até mesmo eventos de vinilófilos, é cada vez mais fácil trocar ou passar adiante as edições que você não quer. E aproveito: se tiver aí um Abaixo de Zero da Noize dando sopa, prometo fazer uma boa oferta. No mais, também vou entender se você decidir adotar a velha máxima de Groucho Marx: “eu recusaria fazer parte de qualquer clube que me aceitasse como membro”.
Reclames da Quinzena
No Programa de Indie, eu e o compadre Igor Muller recebemos dois convidados de peso nas últimas semanas. De um lado, o capo di tutti capi Lucio Ribeiro veio pra falar sobre o Popload Festival que vem aí, Circuito Nova Música e a temperatura da cena alternativa brasileira. Do outro, os paranaenses do Terraplana vieram comentar Natural, disco que eles lançaram em março e é um dos meus favoritos de 2025. E fica o aviso: amanhã tem programa especial sobre o Air, que toca no C6 Fest no fim de semana, tá?
Na Exame, pude bater um papo com Greg Stuart, presidente da associação de marketing MMA Global. O tema? “O marketing poderia ganhar muito se for mais científico”, me disse ele em passagem pelo Brasil.
Em Cajuína, escrevi uma reportagem bacana sobre como a onda de retração dos esforços de diversidade nas empresas americanas está chegando ao Brasil.
Pra fechar, no Scream & Yell tem a versão texto da entrevista que eu e o Igor fizemos com o Car Seat Headrest. Também vale o aviso de que tem papo com o Air.
E no YouTube, tem vídeos do show do português Pedro Abrunhosa na Casa Natura Musical. Também pode se inscrever lá porque nesse fim de semana vai ter muito vídeo de C6 Fest e da Virada Cultural, viu?
Sabia que apesar da frase de Groucho Marx, existe um clube privativo em Londres chamado… Groucho Club? Rachel Weisz e Jarvis Cocker já foram sócios.
Pois é. Nada como um pouco de cultura inútil pra fechar o seu dia.
Um abraço!
Bruno Capelas
PS: Espero que os leitores que são jovens há mais tempo tenham pego a piada do título com o Círculo do Livro, clube de assinatura de livros que fez muito sucesso no Brasil nos anos 1970 e 1980. E ele tinha discos também: graças a ele, a coleção dos Capelas tem um Brasil do João Gilberto que é das coisas mais lindas que tem.
PS2: Caso vocês estejam curiosos, essa edição foi escrita com chá de erva cidreira no copo e a televisão vendo Tottenham e Manchester United no mudo, na final da Liga Europa. Ô joguinho feio.
PS3: Prometo que na próxima edição voltaremos aos drinks. Até porque finalmente chegou o disco que eu queria pra escrever sobre… futebol.
Noize eu desisti. Tem cada artista bizarro ali que nem vender depois eu consigo. Os caras colocam três ou quatro meses de artistas assim e depois aparece um artista relevante. Claro que é difícil agradar todo mundo, e até entendo o porque dessas variações, mas as vezes os caras passam do limite... muito artista underground demais.
eu mantenho a Noize porque pago 75 conto por mês. Coloco cartão temporário quando não quero receber algum disco, mas não cancelo pelo valor da assinatura mesmo.
Já assinei um tempo a Três Selos, mas me estressei demais com o comercial deles. São péssimos, mal educados, maior descaso com o consumidor e fora a pilantragem de cobrar frete e mandar 3 ou 4 discos de vez. Ridículos.
A universal para mim tem sido bem legal, apesar de achar que a arte deixa a desejar, com umas capas parecendo que foram feitas na impressora que eu tinha nos anos 2000 dentro de casa.
Enfim, um dia me estresso de vez e jogo tudo para cima (e logo depois me arrependo com um lançamento que valha a pena).
abraço.