Ho, Ho, Ho: uma playlist de Natal e três drinks de Panetone
Para poupar o leitor de ter que escutar aquele velho disco da Simone ou da Mariah Carey, preparei algo diferente: uma seleção de canções natalinas pop ao lado de três receitas de uma vodka especial

“Então é Natal… e o que você fez?”
Atire a primeira pedra quem nunca teve vontade de pular pela janela quando a Simone canta esse verso: tal como uma uva passa engasgada na garganta ou aquele seu tio bolsonarista que nem piada do pavê faz, essa frase é uma das piores coisas do Natal. Poxa, eu trabalhei o ano inteiro e ainda vem a Simone me julgar? É por isso que no Natal da Meus Discos, Meus Drinks e Nada Mais não tem Simone. E não tem disco natalino – ainda que eu ame de paixão o A Christmas Gift For You From Phil Spector, achei que seria demais fazer uma newsletter inteira falando dele por agora. De maneira que nesse finzinho de 2024, resolvi fazer algo diferente.
De um lado, teremos uma playlist comentada com as minhas músicas favoritas de Natal. Talvez em outros anos eu já tenha compartilhado aqui uma seleção chamada O Natal dos Capelas, que eu fiz no Spotify faz um tempo tentando facilitar a vida de Seu Capelas nos dias festivos – antigamente, quando eu era criança, ele emendava CD atrás de CD com as nossas faixas favoritas, mesmo que às vezes isso significasse trocar de disco a cada três minutos.
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Mas O Natal dos Capelas é uma seleção feita para ser tocada em São Caetano, com o clima que só mesmo a torta de palmito de dona Silvina e o Papai Noel de Paraquedas – leia-se, o melhor enfeite de árvore de Natal da história – podem proporcionar. O que proponho aqui é uma versão remix dessa mixtape familiar, mas com algumas adições particulares. Serão dois lados: o Santa Claus traz só canções anglófonas, enquanto o Papai Noel tem brasileiras (e uma participação especial latina, claro).
Para harmonizar com esse clima natalino, decidi apostar numa receita que há tempos vinha pensando em fazer: a vodka panetone do Marco de la Roche, bartender de quatro costados que, entre outras coisas, é o fundador do Mixology News – referência do conteúdo de coquetelaria no Brasil. Vodka panetone é uma brincadeira que Marco fez há alguns anos, infusionando vodka de boa qualidade com os ingredientes que têm gostinho de Natal: frutas cristalizadas, nozes, amêndoas, avelãs e o que mais vier na cesta comemorativa da firma. No Mixology News, ele propõe dois métodos para sua receita: o sous-vide dá mais trabalho, mas ainda dá tempo de ser feito para a ceia; o da infusão a frio é mais fácil, mas talvez fique pro ano que vem.

Aqui em casa, fiz o método da infusão a frio, com algumas substituições: usei só o açúcar demerara e troquei macadâmias e etc por algo ligeiramente mais brasileiro, como castanha de baru, de caju e do pará. Comprei todos os ingredientes numa vibe “mix de castanhas” na loja de cereais & temperos do bairro – deve ter uma perto de você, aposto – e deixei quatro dias infusionando em 500ml de vodka Absolut, para depois filtrar com filtro de café por algumas horas. Aí, vale lembrar, é só guardar num vidro esterilizado na geladeira. A receita ficou bacana, mas vale o aviso: descasque bem todas as castanhas que você for usar, pois a casca deixa um retrogosto chatinho na bebida. Explicações iniciais dadas, vamos às receitas: o Papai Noel Kamikaze, a Caipirinha de Natal e o Panetone Sour.
Papai Noel Kamikaze
30 ml de vodka panetone
20 ml de suco de limão
10 ml de triple sec / licor de laranja
Adaptado do Kamikaze (do qual já escrevi aqui), o Papai Noel Kamikaze foi a minha receita favorita das três que estão aqui. Acho que é culpa do licor de laranja, que dá uma união bacana entre o cítrico do limão e o amendoado que vem da vodka panetone. E não estranhe a cor: é tudo culpa do curaçau blue que insiste em não acabar aqui em casa. Pra fazer, é fácil: bata tudo na coqueteleira com gelo e coe para uma taça Martini ou Coupé.
Caipirinha de Natal
90 ml de vodka panetone
Meio limão fatiado em oito partes
1 jato de bitter de laranja
1 jato de essência de baunilha (aquela de bolo serve)
Se o Papai Noel Kamikaze é um drink mais experimentado, a Caipirinha de Natal pode ser uma pegadinha divertida na família – especialmente com aquele tio que adora a bebida tradicional, mas é mais ou menos aberto a experiências & pesquisas. No mais, não preciso explicar como faz Caipirinha, certo?
Panetone Sour
30 ml de bourbon
20 ml de vodka panetone
10 ml de suco de limão
1 jato de Angostura (bitter aromático)
Uma das coisas legais sobre a vodka panetone é que ela pode servir não apenas como base, mas também como álcool complemento – afinal, a adição de açúcar e frutas a aproxima de um licor. É o que fiz aqui neste Panetone Sour, que brinca com a receita do Amaretto Sour para trazer o sabor de Natal a um coquetel que eu amo. Quer fazer? Então coloca tudo na coqueteleira, bate com gelo por uns 10 segundos e põe num copo rocks (ou nessa tacinha de licor que eu usei).
Agora, bora para a playlist? Prometo que vai ser o melhor jeito de passar o Natal bonito na sala de estar.
Lado A - Santa Claus
“Here Comes Santa Claus”, Elvis Presley: na casa dos Capelas, o clima de Natal começa mesmo quando a gente monta a árvore – oficialmente, no dia 8 de dezembro, dia de Imaculada Conceição. E montar a árvore (algo que não fiz este ano, desculpa mãe) significa botar Elvis Presley para tocar: o Rei do Rock gravou, no final dos anos 1950, uma série de singles de Natal para ninguém botar defeito. Essa é uma das minhas favoritas, ao lado de “I’ll Be Home for Christmas”, que toca na cena final de Máquina Mortífera, um dos “meus filmes favoritos de Natal que não são de Natal.”
“Christmas (Baby Please Come Home)”, Darlene Love: se há um disco de Natal que eu amo, como já disse, este é A Christmas Gift For You From Phil Spector. Não há muito o que explicar: é o produtor responsável pelo wall of sound esticando os limites do conceito com sininhos de Natal e vocais de gente como The Ronettes, The Crystals, Bob B. Soxx & The Blue Jeans e, claro, Darlene Love – que muita gente conhece justamente de… Máquina Mortífera. Poderia ter incluído várias dele na seleção, mas fico com essa pelo vocal apaixonado de Darlene, que sofreu muito na mão de Spector – aliás, um ser humano desprezível… a despeito de ser um produtor dos mais geniais. Toda família tem um desses.
“Jingle Bells”, Booker T. & the MG's: Natal que se preze tem que ter música instrumental e tem que ter Jingle Bells. Mas se é pra ter, que seja com molho – e nada melhor que apelar para o Booker T. & The MG’s, histórico grupo da Stax que tem um excelente disco de Natal de 1966, suingado até o extremo. Esse aqui é pra você já ir balançando da cozinha pra sala, mas cuidado pra não deixar o Tender cair.
“The Chipmunk Song”, Alvin & The Chipmunks: muito antes de virar uma série de filmes infantis mais ou menos, Alvin e os Esquilos eram donos de uma das músicas de Natal mais legais da história – que o diga Cameron Crowe, que abre Quase Famosos com esta aqui na trilha. Não tem o que explicar: é ouvir e dar risada dos efeitos malucos pra gerar a voz dos esquilos. Por favor, Natal, não demore.
“Last Christmas”, Wham!: Para mim, Natal significa família – e claro, comilança. Mas também é uma época em que muitos sentimentos vêm à tona, incluindo corações partidos. São marcas do que se foi, já dizia a canção, e por isso acho mais que justa a inclusão desse petardo de George Michael e Andrew Ridgeley nessa seleção. Se você está sofrendo de amor nesse Natal, fica aqui meu desejo: que no ano que vem você possa dar seu coração a alguém especial.
“Little Saint Nick”, The Beach Boys: Nos anos 1960, era tradição mais que extrema que todos os artistas americanos de vulto gravassem um disco de Natal – e os Beach Boys não são exceção. Mas a graça dessas gravações, além de ter Brian Wilson de gorrinho de Papai Noel, é ver como as vozes harmoniosas dos garotos da praia se desdobram tão bem pra fazer um coral natalino mais moderno, mais divertido. “Little Saint Nick”, que conta a história de São Nicolau, é linda, é cheia de graça.
“Jesus Christ”, Big Star: Pra muita gente, “Jesus Christ” não é bem uma música de Natal – não tem sinos, não fala de Papai Noel nem de presentes. Mas a rigor, ela é: uma canção que celebra a chegada do Deus Menino, com a guitarra de 12 cordas de Alex Chilton pronta para nos abençoar. De quebra, ainda é de uma banda que dá uma piscadela para a Estrela de Belém. Durante muito tempo em que o Facebook existia de verdade, minha tradição de Natal digital era publicar essa aqui assim que acordava na manhã do dia 25 de Dezembro. E se você precisa de presentes, bem… fica atento no que o Programa de Indie vai soltar essa semana.
“River”, Joni Mitchell: já que o assunto é música de Natal fora do padrão, é impossível não falar de “River”, da Joni Mitchell. Uma das canções mais bem formatadas de Blue, obra-prima da cantora canadense, “River” é o ponto mais triste dessa seleção. Não é só uma canção sobre coração partido: é também uma escolha para lembrar que tá tudo bem ser triste em dezembro, enquanto muita gente senta à mesa com a família. Talvez seja a minha favorita de toda a lista – assim como Duro de Matar é o filme de Natal preferido de muita gente.
“Happy Xmas (War is Over)”, John Lennon & Yoko Ono: eu disse que não ia ter Simone, mas não falei nada sobre a versão original de Lennon & Yoko. A verdade é que eu acho “Happy Xmas” uma baladaça incrível, não só pelo subtítulo “War is Over” (presente num cartaz que eu vejo todos os dias na sala de casa), mas também pela coragem com que Lennon olha para o futuro: “and so merry xmas/and a happy new year/let’s hope it’s a good one/without any fear”.
“White Christmas”, Otis Redding: eu não poderia deixar o lado A da seleção se encerrar de maneira triste. Por isso, recrutei outro mestre da Stax, Otis Redding, para deixar o final deste canto da fita mais suingado. Presente na trilha de outro clássico longa natalino, Simplesmente Amor, “White Christmas” é uma composição de ninguém menos que Irving Berlin, e tem todos os clichês que se espera de uma canção anglófona sobre essa época do ano. Tudo bem: Otis Redding salva tudo.
Lado B - Papai Noel
“Hoje é Natal”, Cassiano: na verdade, eu deixei Otis Redding no final do lado A só pra poder começar o lado B com esta pérola de Cassiano, que abre o incrível Cuban Soul (18 Kilates). Além dos arranjos maravilhosos e da voz impecável do compositor de “Coleção”, eu gosto particularmente da letra desta aqui, um afago maravilhoso em quem perdeu um ente querido mas, a despeito disso tudo, sabe como celebrar esta época do ano.
“Boas Festas”, Novos Baianos: simplesmente a maior canção de Natal já escrita, pelo incrível Assis Valente, em seu arranjo definitivo. Não tem muito o que dizer além disso, mas se você precisa de mais alguma prova, vale a lembrança do verso “eu pensei que todo mundo fosse filho de Papai Noel”. Cortante e animada na mesma medida.
“Presente de Natal”, João Gilberto: nada melhor que seguir com João Gilberto depois de ouvir os Novos Baianos. Talvez um número menor da fase inicial de João (a dos três discos brasileiros, iniciada com Chega de Saudade), “Presente de Natal” é uma fofurinha, perfeita para se admirar a capacidade do cantor em brincar com onomatopeias.
“Véspera de Natal”, Adoniran Barbosa: o Natal brasileiro não tem neve, não tem rena nem trenó – e talvez fizesse muito bem pra gente bolar um Papai Noel de bermudão e chinelo Rider. Enquanto isso não acontece, pelo menos dá pra se divertir com esse samba gostoso do genial Adoniran, que sacaneia a ideia de um bom velhinho descendo pela chaminé. E se falar que São Paulo é o túmulo do samba, coloco dose extra de uva passa no teu arroz, viu?
“É Natal”, Lulina: uma das coisas que eu mais gosto de fazer todo dezembro é procurar por novas canções que falem de Natal. Acho não só empolgante porque compor é registrar comportamentos de época, mas também porque a canção natalina é um formato muito interessante. E aqui, a pernambucana Lulina brilha com um retrato bem humorado das tradições brasileiras (especialmente ao rimar Simone com interfone). Tão fofa que podia até virar jingle da Turma da Mônica.
“Sino de Belém”, Pato Fu: minha banda brasileira do coração não poderia ficar de fora, ainda mais nessa releitura gostosa de um clássico em versão música de brinquedo. É uma daquelas músicas que a gente pega pelo pacote e sabe que não é meia nem uma camiseta da Hering. Aliás: que saudade de ver uma caixa grande na árvore de Natal e achar que é uma bicicleta novinha, hein?
“O Homem de Nazareth”, Luiz Caldas: se os gringos tem “Jesus Christ”, a gente tem “O Homem de Nazareth”: uma belíssima canção pop composta por Antônio Marcos – o ex-marido da Vanusa, o cara que escreveu a incrível “Como Vai Você”. Afinal de contas, “o mundo só será feliz se a gente cultivar o amor”. Só não coloquei a gravação original (que você pode ouvir aqui embaixo) para não destoar do clima da playlist – e aí optei por essa versão hey rockers de outro cara subestimadíssimo: Luiz Caldas. Sente a guitarra.
“Navidad en Los Santos”, Él Mató A Un Policía Motorizado & Superguidis: e se “River” é a canção de Natal não-natalina da lista internacional, esta aqui é a minha música favorita de Natal sem sininho nem coro. Lançada no meio dos anos 2000 pelos argentinos do Él Mató a Un Policía Motorizado, “Navidad en los Santos” conta uma daquelas histórias tristes de Natal – ser procurado pela polícia enquanto a família fatia o peru. Essa versão aqui é extremamente interessante por ter sido executada ao vivo com a participação especial de Andrio Maquenzi, da Superguidis, em um festival El Mapa de Todos.
“Então, Papai Noel”, Nevilton: dentro da excelente ideia de canções contemporâneas de Natal, uma das minhas favoritas dos últimos anos é esta aqui do grande Nevilton – o guitar hero paranaense que fez pepitas como De Verdade e Sacode, cheias de pérolas pop. “Então Papai Noel” é aquele esquema: pedir uma guitarra e torcer pra ouvir Ramones a vida inteira. Bom demais, né?
“Os Meninos da Mangueira”, Ataulpho Jr.: pra fechar, nada melhor que um sambão já antecipando o clima de Ano Novo. E eu gosto muito da mensagem positiva, da esperança e do otimismo que vem de “Os Meninos da Mangueira”, composição do flautista Rildo Hora e do jornalista Sérgio Cabral homenageando a velha escola de Cartola. É a ponte que emenda o Natal no Carnaval, naquele ciclo eterno do calendário do brasileiro. Alô, comunidade!
Reclames da Semana
No Programa de Indie das últimas duas semanas, eu e o chapa Igor Muller não só batemos um papo com o Pullovers (que também já apareceu aqui na newsletter), como também elencamos as últimas novidades de 2024. E fique atento: amanhã lançaremos um dos programas mais especiais da nossa história.
Em Cajuína, tem dois textos meus recentes – um sobre a série de reformas que a rede de farmácias Pague Menos fez em suas lojas; outro sobre como a BeFly criou um feriado em um semestre sem feriados. Mas mais importante que isso é o Goles de inspiração para o RH, um especial de mais de 100 páginas no qual colaborei com uma série de entrevistas com grandes nomes de empresas como XP, Google, Gerdau, Quinto Andar e muito mais. Baixa lá.
Pra fechar a conta de 2024, no canal do YouTube teve os shows de Boogarins e Paula Cavalciuk. Mas calma: antes do fim do ano, lanço um “vale a pena ver de novo” com vídeos ainda inéditos de alguns dos melhores shows do ano – já já tem Paul McCartney, Eric Clapton, Egberto Gismonti e muito mais. Cola na grade.
No mais, desejo a todos vocês, convivas, um Feliz Natal e um excelente 2025 cheio de discos e drinks. A gente se vê do outro lado?
Um abraço,
Bruno Capelas
PS: Este texto foi obviamente escrito ao som da playlist que o acompanha – e também de silêncio na madrugada da Santa Cecília, em um dos últimos dias úteis do ano. Uma meta para 2025? Voltar a não precisar escrever os textos da newsletter de véspera.
PS2: A ideia inicial era ter um Noeltini – um martini com vodka panetone e vermute branco, mas o resultado ficou horroroso. Simplesmente horroroso. Mas se você tiver tentado alguma receita, adoraria saber se deu certo! Me conta? Além disso, se tiver alguma sugestão de disco ou drink que quer ver por aqui em 2025, essa é a hora!
PS3: Olhei pra trás e rechequei minhas metas de 2024. De todas elas, só cumpri uma em totalidade: voltar pras aulas de espanhol. As outras todas (incluindo alcançar um número mágico de assinantes nesta newsletter) acabaram ficando pelo caminho. Tudo bem: como diria certa maga da política nacional, a gente cria a meta, dobra a meta e depois conta o que é. Que venha 2025.
por mais um ano, joni mitchell foi minha cantora mais escutada ao longo dos meses, então venho reforçar a faixa "river" dessa playlist. me pega muito uma música de natal com a frase "eu sou egoísta e eu estou triste" (acho heterodoxo) usada no contexto de uma pessoa que só quer patinar no gelo (se não me engano, é baseada na memória da própria joni, na época em que ela ficou hospitalizada com poliomielite na infância).